Louis Braille nasceu em 4 de janeiro de 1809, na pequena cidade francesa de Coupvray, pertencente ao distrito de Seine-Marne, a cerca de 45km de Paris. No ano de 1812, ao brincar como de costume na oficina de seu pai, feriu o olho esquerdo ao tentar perfurar um pedaço de couro com um objeto pontiagudo, causando grave hemorragia. O ferimento infeccionou e, como não havia auxílio médico eficaz para eliminar o centro da infecção.
Alguns meses mais tarde, a infecção atingiu o outro olho e a cegueira total adveio quando Louis estava com cinco anos. Seus pais ainda tentaram vários tratamentos, consultaram vários oculistas, inclusive em cidades vizinhas, mas todos os esforços foram em vão, pois a infecção generalizada havia destruído ambas as córneas.
Mesmo convivendo com a cegueira, Louis era um estudante exemplar: decorava e recitava as lições que ouvia, confundindo seus professores com sua inteligência brilhante. Aos 10 anos, ele conseguiu uma bolsa de estudos no Instituto Real dos Jovens Cegos de Paris, a primeira escola para cegos do mundo. Na Instituição, o ensino consistia em fazer os alunos repetirem as explicações e os textos ouvidos. Alguns livros escritos no sistema de Valentin Haüy, método oficial de leitura para cegos da época, permitiam leitura suplementar. Esses poucos livros eram os únicos existentes.
Louis dedicou-se profundamente aos estudos, mas a recreação também era parte importante na vida da escola, e ele participava com entusiasmo das atividades. Gostava de música clássica e, como os professores do Conservatório vinham dar aulas gratuitas na Instituição, dedicou-se a um estudo que consistia em ouvir e repetir o que era ouvido. As condições não eram ideais, mas Braille tornou-se um excelente pianista e, mais tarde, o talentoso organista de Notre Dame des Champs.
Em agosto de 1821, Braille participou, emocionado, dos preparativos e da homenagem prestada a Valentin Häuy pela Instituição da qual ele era fundador. Nesta ocasião, estiveram reunidos o fundador da primeira escola para cegos e o futuro inventor de um sistema de leitura e escrita para cegos.
A criação do Sistema Braille.
As dificuldades enfrentadas por Louis Braille em seus estudos o levaram, desde cedo, a preocupar-se com a possibilidade de criação de um sistema de escrita para cegos. Para isso, ele contou com a ajuda de outras pessoas, como Charles Barbier de la Serre, capitão de artilharia do exército de Louis XIII, criador de um sistema de sinais em relevo que, quando combinados, transmitiam suas ordens militares para os soldados durante a noite. Assim, mesmo no escuro, seus subordinados podiam decifrar as ordens superiores.
Com o uso do sistema, Barbier pensou na possibilidade de seu processo, denominado “escrita noturna”, servir para a comunicação entre pessoas cegas, transformando-o então num sistema de escrita para cegos, rebatizado de “grafia sonora”.
Através desse sistema, qualquer frase podia ser escrita, mas, como era um sistema fonético, as palavras não podiam ser soletradas. Um grande número de sinais era usado para uma única palavra, o que tornava a decifração longa e difícil. Louis Braille rapidamente aprendeu a usar o sistema, que praticava sempre com um amigo, escrevendo com o auxílio de uma régua guia e de um estilete. Adquirindo maior habilidade no uso do método, ele acabou descobrindo seus problemas e começou a pensar em possíveis modificações.
As dificuldades do sistema de Barbier eram as seguintes: ele não permitia o conhecimento de ortografia, já que os sinais representavam apenas sons; não havia símbolos para pontuação, acentos, números, símbolos matemáticos e notação musical, além da lentidão da leitura devido à complexidade das combinações. O novo sistema de Braille visava eliminar completamente esses problemas com criação de um alfabeto no qual 63 combinações representavam todas as letras do alfabeto, além de acentuação, pontuação e sinais matemáticos. O sistema foi concluído em 1824, quando seu inventor tinha apenas 15 anos de idade,
Apesar da saúde deficiente, pois contraiu tuberculose aos 26 anos, Braille trabalhou constantemente no aperfeiçoamento de seu sistema e, em 1838, publicou a “Pequena Sinopse de Aritmética para Principiantes”. Logo em seguida, em 1839, publicou o “Novo método para representação por sinais de formas de letras, mapas, figuras geométricas e símbolos musicais para uso de cegos”. Este último método consistia em escrever as letras de forma convencional, marcando com o punção uma série de pontos em relevo. Para padronizar a dimensão das letras, Braille determinou em um quadro o número de sinais necessários para cada letra. Esta nova invenção, à qual Braille deu o nome de “grafia pontilhada”, também foi adotada pelos alunos, facilitando a comunicação com os videntes.
Apesar dos esforços de Braille para aperfeiçoar e desenvolver seu sistema, e de sua aceitação pelos alunos da Instituição, o método de ensino continuava sendo as letras em relevo de Valentin Haüy, pois muitos professores conservadores relutavam em abandonar os velhos métodos. O diretor da época era contrário à oficialização do sistema, pois julgava que este isolava os cegos. Em 1840, o ministro francês do Interior, a quem coube a decisão final, opinou que apesar de os estudos em Braille deverem ser encorajados, os responsáveis pelo ensino de cegos ainda não estavam prontos para a mudança do sistema.
Só em 1843, com a transferência do Instituto Real para Jovens Cegos para sua nova sede, é que o seu diretor passou a aceitar o sistema de Braille. Louis ficou profundamente comovido quando, na inauguração do novo prédio, seu método finalmente foi demonstrado publicamente e declarado aceito. Este foi o primeiro passo para a aceitação geral. Daí em diante, seu uso começou a expandir-se por toda a Europa.
Com a saúde cada vez mais frágil, Louis Braille foi obrigado a demitir-se, em 1850, do cargo de professor do Instituto, onde passou a dar apenas algumas aulas de piano. Um ano depois, sofreu uma grande recaída da doença, vindo a falecer em 1852, confiante de que seu trabalho não tinha sido em vão.
Trechos do livro “Louis Braille: sua vida e seu sistema” (Fundação para o Livro do Cego no Brasil, São Paulo, 1978, 2ª edição), redigido por Jurema Lucy Venturini e Teresinha Fleury de Oliveira Rossi (adaptação de Marilia Estevão).
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